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Muitas áreas da cultura têm se proposto a falar do Antropoceno — o período vigente, em que o impacto de algumas ações humanas sobre o meio ambiente se mostrou ainda mais destrutivo, quiçá irreversível. A seu modo, cada campo do conhecimento destrincha nossos graves delitos como humanidade que se pensou superior às outras formas de vida, às outras espécies e a determinados grupos entre seus iguais. Mas é na literatura — sempre ela — que essas dores ganham corpo e contornos capazes de nos tirar da zona de conforto e nos fazer imaginar mundos possíveis, com relações e ações mais harmoniosas, horizontais e coletivas. Depois do fim reúne um time de grandes autores em ensai...
Quem convive com animais decerto já tentou imaginar o que eles sentem ou pensam. Se você fez isso, saiba que não está só.. Na literatura ocidental, não foram poucos os escritores que atribuíram emoções e pensamentos aos animais. O registro mais antigo remonta à Odisseia de Homero, em que o cão Argos reconhece Ulisses após vinte anos e só então morre diante do herói. Alguns contemporâneos foram mais além: conferiram voz particular e espaço narrativo a seres não humanos. Um exemplo recente é Yoko Tawada, que buscou ocupar a interioridade de ursos-polares para depois "traduzi-la" em linguagem humana. No extenso intervalo entre esses dois autores, outros escritores ousaram da...
O livro de Isabela Discacciati propõe uma dupla viagem que se articula no cruzamento da obra de Elena Ferrante, sobretudo sua tetralogia napolitana, inaugurada com A amiga genial, e um vasto repertório italiano presente no itinerário de suas personagens. Para isso, a autora empreende uma jornada em busca dos cenários e pessoas que, espelhados em seus livros, ajudam a compreender melhor as referências literárias de Ferrante, atravessando os universos da mitologia, da religião, da cultura popular e a própria geografia italiana. Brasileira que emigrou para a Itália, onde estudou e trabalha com turismo, arquitetura e história, Isabela também insere no texto experiências autobiográficas que dialogam com a comovente história da amizade e dos conflitos de Lila e Lenu, que conquistou leitoras e leitores em todo o mundo e fez de Elena Ferrante a autora mais celebrada da literatura italiana contemporânea. A edição conta com imagens históricas de acervos italianos.
Organizado a partir de conversas que a antropóloga Aparecida Vilaça e o filósofo Geoffrey Lloyd mantiveram ao longo da pandemia, o livro toma como ponto de partida as notas de campo recolhidas pela antropóloga ao longo de trinta anos de trabalho junto ao povo indígena Wari', que habita o sudoeste da Amazônia. Com um tom informal, os autores procuram diferenças e semelhanças entre a perspectiva Wari' e as ideias dos antigos gregos e chineses acerca de questões fundamentais, como morte, doença, loucura e o que define a humanidade.
Apanhadora de pássaros é um livro surpreendente sobre a ambivalente amizade entre duas mulheres negras. Nele, Gayl Jones tece reflexões necessárias sobre criatividade feminina, papéis de gênero e as vicissitudes da natureza humana. Ambientada sobretudo em Ibiza, com passagens que têm como cenário os Estados Unidos, o Brasil e Madagascar, a história é narrada por Amanda Wordlaw, escritora que acompanha o casal Catherine e Ernest Shuger em suas andanças pelo mundo. Sua missão ao lado deles, assim acredita, é impedir que a talentosa escultora Catherine mate o afetuoso marido Ernest. Catherine é repetidamente internada por tentar pôr fim à vida de Ernest, que ainda assim não a abandona. A narração de Amanda transita entre o tempo em Ibiza e os anos anteriores a isso, apresentados ao leitor como um intrigante quebra-cabeça. Mas o que mantém, Amanda questiona a si mesma e ao leitor, o trio tão unido? A partir desse vínculo bastante peculiar, o leitor tem acesso à escrita inventiva e viciante de Jones.
"A psicanálise, que descobriu o segredo do sintoma humano, pode descobrir também, como os romancistas realistas, que toda ordem cultural gira sobre um segredo próprio, um sintoma específico, um sonho a ser interpretado. Trata-se, de meu ponto de vista, do segredo da estrutura social, que não se revela diretamente na sua realização evidente, mas só através de uma mediação que o dissolva e simbolize, desembaraçando-o das artimanhas de dominação e tornando-o pensável. Assim, o segredo próprio ao sintoma humano repousa sobre o segredo geral de sua cultura, e a ordem dos dois é a mesma que a dos sonhos." (Tales Ab'Sáber) Em fragmentos de sua própria experiência na clínica, onde tudo tem início e fim em psicanálise, Ab'Sáber nos apresenta um mergulho profundo e desafiador na trama simbólica e concreta do mundo na determinação das formas de sofrimento psíquico atuais.
Era uma vez uma pequena nação que vivia sob a bota pesada de seu líder, o General Bigode. Nesse país excessivamente quente e infestado de moscas, mora uma família disfuncional, a começar pelo pai, um militar gago — e também o favorito do General — que ostenta as incontáveis medalhas conquistadas graças aos serviços prestados à pátria, e pela mãe, mulher traumatizada por uma tragédia familiar que encontrou no casamento a chance de uma vida mais confortável, ainda que a maternidade lhe seja insuportável. Dessa união, nasceram três filhos: Cassandra, a mais velha, perspicaz e manipuladora, sexualmente atraída por objetos, sobretudo enferrujados; Caleb, o do meio, detentor...
A história tocante de uma mulher que, em um momento crítico, descobre ter mais em comum com a mãe do que já foi capaz de imaginar. A vida de Nerea não anda bem: o trabalho não a estimula, não tem tempo para a filha e sente que o casamento está ruindo. E um último golpe ainda a atinge: sua mãe, Luisa, é encontrada vagando pelas ruas com a memória gravemente comprometida. A partir de então, Nerea passa também a carregar o peso da culpa por não ter detectado a tempo mudanças no comportamento da mãe, algo que talvez pudesse ter evitado a crise que culminou com a hospitalização. Nas longas horas em que permanece ao lado da cama de Luisa, percebe o apego da mãe a uma lembrança da juventude que o esquecimento não dissipou: ela chama sem parar o nome Germán, alguém de quem Nerea nunca ouvira falar. Com isso, descobrirá um episódio fundamental na vida de Luisa, ao mesmo tempo que será forçada a enfrentar o próprio passado. As mãos da minha mãe é um best-seller da literatura basca desde o lançamento, em 2008. Recebeu inúmeros prêmios literários locais, como o Euskadi de Plata. Sua tradução para o inglês recebeu o English PEN Award em 2018.
Desarquivando o literário: percursos entre línguas oferece diferentes trilhas pelas literaturas brasileira, italiana, chilena, moçambicana e inglesa, para pensar contatos, contágios e ramificações a partir do próprio gesto do literário. Os onze ensaios aqui reunidos apresentam uma visão transdisciplinar e descolonizadora da literatura, promovendo um debate plural através da diversidade e compartilhamento de saberes. Os textos refletem essa perspectiva supranacional, enfatizando a valorização dos saberes locais e a visão do outro por meio de práticas culturais diversas. Esta "migração cultural", levar algo de uma língua para outra, falar de uma determinada cultura num outro contexto, cria redes de diálogo entre regiões linguísticas e geopolíticas, destacando a importância do olhar pela diferença e do intercâmbio cultural.
Este livro nasceu do desejo de deixar falar nossas contradições. Não que elas precisem de permissão para circular, uma vez que se impõem e rompem o controle do dizer, como testemunhamos na clínica psicanalítica e no dia a dia. Mas bem podiam ser escutadas com mais frequência, em vez de silenciadas. Legitimadas e analisadas em nossos dizeres supostamente clandestinos e forasteiros. Pois é no estranhamento com a própria fala que conseguimos entrar em contato com aquilo que nos é mais íntimo. Reconhecer as inerentes inconsistências de si e do outro é também uma forma de estarmos em contato com a verdade do sujeito – aquela que emerge e dá sinais por meio da linguagem e do inco...